45 minutos

"45 minutos"


Acordo com os raios de sol batendo em meus olhos através da janela de vidro, normalmente elas têm cortinas, mas por algum motivo as mesmas haviam sumido. Tateei pelo chão na esperança de encontrar o meu telefone, e não é que encontrei mesmo. Por um milagre o aparelho estava intacto. Não me lembro de muita coisa da noite de ontem, mas sei que ele sofreu muitas quedas e um possível afogamento dentro dum copo de cerveja. Faltavam 10 minutos pra's 12h.
- "Merda, já devia estar na Uni... Hammm, hoje é sábado!" - pensei, e em seguida suspirei. Ainda tinha dia pra mais umas cervejas.
O cheiro de cerveja estava por toda casa, e junto com o cheiro de nicotina e urina de bêbados fazia meu estômago revirar. Os copos descartáveis estavam espalhados por todos os cantos da casa, ao lado da imensas garrafas de cerveja havia uma poça de vómito e então deduzi que estava no chão da sala, pois uma única pessoa havia vomitado lá. Sorri ao lembrar da cena da noite passada.
- "Nunca mais obrigo o Eduardo a beber, estômago fraco." - pensei enquanto sorria.
Passei a mão pelo rosto e depois de uns bons minutos consegui me colocar em pé, mas fui recebida com uma dor de cabeça forte e uma leve tontura. De acordo as evidências do local concluí que era ressaca. Claro, o que mais seria? Olhei em volta, não vi nenhum dos meus amigos. Será que foram-se embora sem terem a bondade de me ajudar a limpar a bagunça da casa?
- " Haters..." - pensei.
Fui caminhando até meu quarto e passando pelo corredor deparei-me com um deles sentado numa cadeira que obviamente devia estar na sala, a cadeira estava impedindo a passagem para o corredor e ele estava de costas. Como raios alguém bêbado conseguiu dormir sentado numa cadeira dessas?
Consegui identificá-lo por causa dos ténis, William tinha mesmo um péssimo gosto. 
- Hey! - disse enquanto me aproximava, e quando estava suficientemente perto dele dei um toque no ombro. 
- William! Acorda txe! Cadê os outros? - não obtive resposta, já estava a ficar sem paciência, na verdade nunca tive. Dei mais uns toques no ombro e nada, o desgraçado dormia como uma pedra.
- William! - chamei enquanto contornava a cadeira ficando assim na frente dele.
- Acorda porra! - dessa vez dei uma sacudida bem forte com o olhos fechados pois minha cabeça dóia bastante e não conseguia manter meus olhos abertos.
Ao fazer isso, senti algo caindo e rolando pelo chão, quando abri os olhos me desequilibrei e caí de costas, meu estômago revirou e tudo que eu havia ingerido ontem saiu espontaneamente.
- Não... Não, não não não não... meu cérebro está a enganar-me por causa da bebida... É a bebida é a bebida...
Eu não queria acreditar no que estava a ver, o corpo do William estava sem a cabeça, era a cabeça que havia rolado pelo chão. Minha visão ficou nítida por causa do choque, e só então eu reparei na poça de sangue que estava bem na minha frente... 
- Não... Isso não pode estar a acontecer, eu só devo estar a sonhar, só dev... 
Trim! Trim! Trim! o telefone em minha mão chamava mas eu não sentia apesar de o apertar com toda força que eu tinha naquele momento. Minhas mãos tremiam de forma incontrolável, meu corpo suava e eu não conseguia deixar de olhar para o cadáver que estava a minha frente.
Levantei daí aos prantos, sem saber pra onde ia, naquele momento esqueci de todos os compartimentos da minha casa. Não dei importância ao telefone que chamava vezes sem conta em minha mão congelada pelo medo. Apesar de passarem milhares de coisas em minha mente, eu só conseguia focar em encontrar os outros, precisava encontrar os outros e sair daí apesar de estar psicologicamente desorientada.
- Cláudia! Luís...! - gritava enquanto andava as voltas, de um lado pro outro. - Elisa...? Paulo...! Eduardo...
Alguém por favor...
Comecei a ficar desesperada, o telefone vibrou novamente e dessa vez meu reflexo foi atender e levar rapidamente ao ouvido.
- Alô? Por favor, preciso de ajuda! Tem alguém morto em minha casa e não encontro o resto dos meus amigos! Eles... - travei chorando. 
- E então? - uma voz rouca e grossa respondeu quase como se estivesse a rir. - Estás a divertir-te?
- O-O quê...? Eu... 
- Não não, não respondas. Porque eu estou a divertir-me pra caralho e isso é suficiente. - a pessoa do outro lado do telefone começou a rir, e eu travei. Fiquei muda...
- Alô? Sei que ainda estás aí porque eu consigo ouvir a tua respiração e sinto o cheiro do medo a partir daqui, adoro isso. Tenho a certeza que queres saber o que é que está a se passar, essa cabecinha deve estar bem confusa né? Imagino.
Bom vamos ao que interessa. Eu vou te deixar viver se, me venceres num jogo. Os corpos dos teus queridos amigos estão escondidos pela casa, se os encontrares a todos ganhas, se não já sabes o que acontece. - deu uma leve gargalhada e continuou em seguida. - Se tentares ligar para a polícia morres, se tentares sair antes do jogo acabar morres, e se tentares trapacear, bom... Morres também. Eu estou a observar-te agora, é melhor cumprir tudinho tá? 
- E-Eu nã... - tentei falar mas fui travada pelo medo.
- Hm? Oi? Querias dizer alguma coisa? - questionou ironicamente fazendo meus pêlos da nuca se arrepiarem de súbito. - imaginei que não.
Ah! E só mais uma coisa - disse num tom sério. - Tu tens 45 minutos e começou a contar apartir do momento em que atendeste a minha chamada, então... Boa sorte.
Chamada terminada.
Desabei, não sabia o que fazer... E se aquilo fosse uma partida?
Não... Quem se daria ao trabalho? Tão bem elaborada assim? 
Quem quereria fazer-nos mal? Eu nunca fui uma vaca com ninguém, nunca me meti com ninguém! Eu... Preciso sair daqui, preciso...
Joguei o telefone no chão e corri até a cozinha.
Peguei uma faca no lava louça e mesmo antes de sair daí pra procurar os... os corpos, algo me disse pra virar.
Olhei em volta e vi umas gotas de sangue pingando de dentro do armário, não queria ter visto aquilo mais precisava ver pra sair daí, precisava...
Lentamente levei minha mão ao armário e o abri, meu estômago revirou novamente e vomitei aí no chão. 
Me recompus e olhei novamente pra confirmar. Era um corpo aos pedaços, empilhado de forma organizada no armário, e de acordo com a cabeça era a Elisa... a Elisa...
Não conseguia me mover e só então lembrei do tempo.
Preciso correr. Dois já estão, faltam quatro. Corri até o quarto de banho, a porta estava entreaberta e o medo tomou conta de mim.
Hesitei em entrar por dois minutos, mas depois acabei por empurrar a porta.
Deparei-me com o corpo do Paulo na banheira. Havia vidro quebrado cravado nos olhos dele e a garganta havia sido cortada de forma tão profunda que dava pra ver os ossos.
Não consegui vomitar, caí de joelhos e comecei a chorar. Deitei no chão e chorei, não sei por quanto tempo o fiz... Mas era a única solução que eu havia encontrado.
Levantei-me após me recompor, precisava continuar... Três já estão, faltam três.
Caminhei até o meu quarto, estava perdendo as forças por saber que encontraria todos meus amigos mortos... Não queria ver. Aquilo era doentio... Mas também não queria morrer.
Passei pelo corredor até chegar ao meu quarto, empurro lentamente a porta e me deparo com os corpos nús do Eduardo e da Claúdia na minha cama. Ambos com machados na cabeça. Sorri por um instante, nunca gostei da Claúdia. Cabra...
Cinco já estão, falta u...
Senti uma picada horrível e dolorosa no rim esquerdo, vi sangue pingando no chão. Sangue... Era meu? Não...
Cai de bruços, não conseguia respirar direito, senti alguém se aproximando, barulho de correntes arrastando pelo chão. Fui perdendo a visão, e antes de perder o resto de sentidos e de sentir tudo escuro e pesado, a única e última coisa que eu ouvi naquele momento foi apenas uma frase...
- "Tu perdeste."

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